Os pretos do Niger e do Mali que vão buscar pedras às montanhas para construírem muros de gabiões são mão-de-obra barata para as empresas argelinas. Alguns nem recebem dinheiro: trabalham apenas para comer. Vivem em tendas improvisadas no meio do deserto por toda a duração da sua obra e instalam-se o mais confortavelmente possível. Fabricam cabanas com tábuas e plástico para dormirem, halteres com varões de aço e cimento para se exercitarem, e até guitarras com paus, latas e arames. Alguns, enquanto atiram pedras de um lado para o outro, cantam músicas melancólicas com letras incompreensíveis. As suas músicas, em particular, são o que mais me emociona. Sabe-se lá se são alegres ou tristes, de onde vêm, o que querem dizer, quem as compôs. Quando não há vento e o deserto está em silêncio, as suas vozes enchem o ar, o sítio ganha a banda sonora que se lhe adequa e surge uma atmosfera confortável, como se estar aqui começasse a fazer sentido: da mesma forma que nos filmes a música complementa a acção do ecrã.
É por isso que se ao passar perto dos muros e eles estiverem a cantar, aproximo-me muito devagar para que não reparem que cheguei.
Ao subir para a carrinha para ir fazer um trabalho a um quilómetro dali, o Mustapha, um servente preguiçoso, aponta para o rádio e pede-me entusiasmado:
- Ali Farka, Ali Farka!
Porque já tinha andado antes na carrinha comigo.
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